Pois é, entre as décadas de 80 e de 90 do século passado tinha eu uma boa e grande marcenaria com alguns companheiros de trabalho.
Fazia todo tipo de móveis de pinus, madeira esta, plantada em toda a regiâo de Avaré - SP. Portanto, era barata e fácil de encontrar em serrarias.
Entre o fazer móveis, esporadicamente pegava entalhes para fazer em madeira mais nobre.
A especialidade mesmo, era fazer móveis e, para isso mantinha sempre uma quantidade de Pinus secando, já que para móveis a madeira deveria estar sempre bem seca para não abrir ou rachar.
Sempre que precisava comprar madeira em outra cidade pedia para sair com o Sr. Urbano que, sem cobrar nada, trazia a madeira de uma cidade próxima.
O Sr. Urbano era um tipo de mascate que vendia linguiça Cambuí e mortadela em vendinhas pelo interior mais próximo de Avaré.
Eram vendinhas que vendiam para trabalhadores rurais. Vendas estas , que eram marcadas numa caderneta e os trabalhadores pagavam no fim do mês ao receberem seus salários.
Era do mesmo jeito que o Sr. Urbano fazia com os donos das vendinhas. Entregava o novo pedido depois olhava na sua própria cadernetinha o que o freguês estava devendo do mês anteiror. Devo ressaltar que são atitudes de honra e confiança que caracterizam parte do povo brasileiro.
Toda vez que o Sr. Urbano parava para vender e conversar com o proprietário da venda eu saia da sua Kombi para esticar as pernas e observar a região, suas árvores, casas e comportamento das pessoas.
Foi aí que no vilarejo da Barra Grande entre um grande cercado de tábuas brancas, bem distante avistei um maravilhoso cavalo no outro extremo do cercado , bem longe e de costas para mim.
Fiquei impressionado! Era um cavalo grande e forte, de cor beje muito brilhante, crina e rabo longos e brancos esvoaçando levemnte com a brisa do campo.
Extasiado, fiquei observando e refletindo por bom tempo como um cavalo poderia ser tão maravilhoso.
Pus-me de sobressalto quando o distante cavalo, ainda de costas, virou o pescoço e olhou-me por alguns segundos. Fiquei nesse instante paralizado, estupefato, meu corpo estremeceu.
Pensei; será que esse animal captou um amor que já sentia por ele?
E não foi que ele virou-se e veio caminhando devagar, passo a passo, em minha direção olhando-me fixamente.
Meu coração batia cada vez mais forte, sentia que algo nunca sentido antes acontecia naquele momento.
Quanto mais se aproximava, com o Sol refletindo em seus pelos, mais parecia que ele possuia sua própria luz. Ainda com o coração batendo a mil refletia como eu e um cavalo que nunca havia visto pudéssemos nos entrelaçar com sentimentos tão inusitados.
Pois bem, quando chegou perto de mim passou a cabeça por cima do cercado e, assustado afastei-me, minha mente não ainda não discernia direito entre tanta emoções surpreendentes, mas ele balançou a cabeça para cima e para o lado como se dissesse: aproxime-se. Cheguei mais perto e cuidadosamente passei a mão sobre sua testa e ele esfregou suavemente sua cabeça em mim.
Ele tinha olhos azuis e uma manchinha branca na testa. Aquele acontecimento despertou em mim uma sensação maravilhosa de entrosamento com o cavalo e a natureza naquele dia.
Depois disso, eu e o Sr. Urbano nos dirigimos à serraria para pegar a madeira que precisava.
Depois de alguns anos um conhecido falou-me que aquele cavalo era especial mesmo, pois ele fazia espetáculos com seu proprietário.
Enfim, a lembrança do Sr. Urbano, da sua esposa Dona Izabel e do cavalo que já partiram para outra vida permanecem muito forte em meu coração.
Rubens Prata
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